“Marcela manda que lhe aconselhe, manda dizer que se nada der certo, tu jogues esse tal baú ao mar e se junte a nós, nessa brincadeira de vazios”
"Ser poeta é ser mais alto, é ser maior. Morder como quem beija. É ter cá dentro um astro que flameja. É ter fome, é ter sede de Infinito!" (Florbela Espanca)
domingo, 28 de novembro de 2010
Não existe Amor, só vontade.
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
Brincando de ser vazio
Caro amigo,
se discordastes de meus novos métodos com o amor, reprovarás ainda mais a vida mundana a que venho me entregando, tão vazia que se eu gritar, fará eco. Eco, bem dentro de mim e de todo esse vazio que agora sou eu.
Tudo começou quando conheci Marcela, àquela garota conseguiu de alguma forma inexplicável sufocar os próprios sentimentos a ponto de quase não senti-los. Primeiro tive pena de Marcela e toda sua cafajestagem. Tive mais pena ainda das suas vítimas, as vítimas que ela não dá esperança, mas que mesmo assim se decepcionam diante do seu espírito “prático” de não querer mais nada das mulheres, senão sexo e de preferência do bom.
Marcela, como tu e a maioria de nossos amigos, é fissurada nesse tal Caio Fernando Abreu, mas acho que sua leitura é um tanto limitada aos capítulos fatalistas, realistas, trágicos ou qualquer coisa nesse sentido. Essa mulher tem um humor negro irresistível e adora ouvir blues, enquanto traga seus inseparáveis cigarros e se embebeda com cervejas não tão geladas. Mas o mais atraente em Marcela, meu amigo, é a forma como ela pensa em todas as coisas do mundo, para não pensar naquilo que a incomoda. Assim, no fim do expediente de um dia sacana de trabalho, eu sento no sofá da sala dela, afrouxando a gravata e ouvindo ela falar em trânsito, big bang, política e concatenando tudo isso como se fosse uma coisa só e é, então, que a acho incrivelmente irresistível. Pena que ela não gosta de homem e isso é muito mais uma qualidade do que qualquer outra coisa.
Então, meu querido, perdoe a frieza com que lhe escrevo, com ásperas palavras de indiferença, mas a vibe é outra. Tenho aprendido com Marcela de que de nada adianta ficar chorando pelos cantos por amores infalíveis que sucumbiram diante da primeira impossibilidade, nem se apegar a cartas antigas – a propósito, queimei metade delas e a outra metade está tão bem guardada que por hora tenho preguiça de procurá-las – ou lembranças, porque enquanto choramingamos o mundo gira e as coisas acontecem sem que estejamos lá para presenciá-las...
Enquanto lhe escrevo essa carta – perdoe as folhas de guardanapo – Marcela manda que lhe aconselhe, manda dizer que se nada der certo, tu jogues esse tal baú ao mar e se junte a nós, nessa brincadeira de vazios, porque o mundo está cheio de pessoas superficiais o suficiente para apenas quererem satisfazer nossa libido e se esquecerem de nós, como nós certamente as esqueceremos depois que a ardência passar. Marcela ri e pergunta se homem têm ardência e enquanto ela ri eu tenho pena dela, mais uma vez, tentando ser forte em meio a tempestade. Então não fique triste comigo, ou com ela, porque cafajestagem, meu amigo, é apenas uma capa que esconde fragilidade, desesperança e medo, e é isso mesmo, cada um se defende como pode.
Mas conselhos marcelísticos a parte, enquanto lia sua última carta aconteceu o mesmo de sempre, me vi em suas palavras. Então, mesmo que estejamos em sintonias diferentes, espero que consigas me enxergar em toda essa sujeira, pois é como eu disse, cada um se defende como pode e lembranças, quando alimentadas, se tornam dragões que a cada dia nos arrancam uma parte do corpo e temos que nos acostumar a viver sem ela. Estou apenas matando esse tal dragão, antes que ele me devore.
Hoje quem vos fala é aquele Desconexo bem vestido que antes de sair de casa sempre olha em direção a estante empoeirada onde jaz o poeta. Aquele filho da puta não me entende e é por isso que vivemos assim agora, separados. Eu tenho inveja dele e ele pena de mim, do mesmo modo que tenho pena de Marcela. E assim vamos vivendo, sem a melhor parte de cada um de nós.
Mas acontece que no fim da noite, ou melhor, no começo do dia, quando o bar está vazio e mais escuro que o normal, Marcela no banheiro ou num motel barato comendo um mulher sem nome, que ela jamais olhará nos olhos – um dia desses eu te conto essa teoria dela – e eu aqui sozinho bebendo cachaça pura enquanto fumo minha quinta carteira de cigarro esse tal Poeta Desconexo senta aqui a meu lado, bebe de minha bebida, fuma de meus cigarros apreciando minha teoria de que fumando aos pouquinhos se tem mais chance de morrer de câncer do que fumar sem parar, porque pessoas assim ainda morrem de velhice contrariando as estatísticas.
Ele bebe e fuma em silêncio. Nós bebemos e fumamos em silêncio. Enquanto eu penso em uma definição para vazio, ausência e falta o desgraçado me olha com aquela expressão de “sou bem mais que você” e diz, como se falasse a uma criança: um dia você se cansa de tudo isso.
Saudações,
do puto Desconexo.
sexta-feira, 27 de agosto de 2010
Sorriso-Lágrima
O que eu queria agora era ler um Desconexo amante e escrever como um Poeta no cio. Eu fiquei feliz em saber que a minha última carta te passou esperança, porque era realmente o que eu estava sentindo. Ando tão sem chão, tão sem nada que me fugiram até os ideais. Agora tenho raiva até dos ditos populares, imagine você. Oras, se a esperança é a última que morre, o que pode um poeta como eu estar sentindo? Sabe-se lá o que vem depois dela, se vem. É qualquer coisa como saudade, mas que arde como ácido em ferida aberta. Apesar de tudo, estamos aqui, firmes, tentando.
quinta-feira, 29 de julho de 2010
Um tal Desconexo
quarta-feira, 27 de janeiro de 2010
A terceira estrofe.
Oi, meu nome é Poeta, tenho mais de duas décadas de vida, sou uma constante vítima do Amor e luto, veemente, para aprender a lidar com ele. Amar pra mim sempre foi sinônimo de loucura. E só. E um monte de outras coisas também!
Sou um amante das mulheres, adoro todas: sem nome, endereço ou telefone. Mentira: algumas me fascinam mais e têm nome, endereço e telefone. Mentira de novo: apenas uma tem me fascinado!
Gosto muito da madrugada, não gosto muito do dia e suas obrigações e chateações. Eu gosto de calmaria, cigarro e livros. Livros me fascinam tanto quanto mulheres! Quase sempre carrego um por baixo do braço, aliás, eu sempre digo é que estou por baixo dos braços deles. Entendem agora a comparação com as mulheres? Sou um sempre apaixonado. Amo, decreto felicidade sem fim e encaro a morte quando são amores efêmeros e vis, o que eu nunca espero.
Sou amigo do barbeiro há alguns anos e freqüento a barbearia para falar desses amores vis e daqueles que me surpreendem pela força. O assunto sempre é Amor. Sou amigo do Desconexo porque ele, como eu, entende o valor da palavra. E também gosta muito de falar sobre o tal do Amor.
Nada que o vento já não tenha levado. Aliás, eis aqui um ser que valoriza a vida após o fim do Amor. Enquanto posso, amarei dez mil vezes mais. Eu digo sempre que é muito sortuda aquela que me tem depois de uma morte. Revivo doando Amor aos ventos.
Eu não acho que as fotografias se desgastam, elas continuam lá com os mesmos sorrisos, os mesmos laços invisíveis. O que se desgastam são as pessoas. A ilusão nos faz viver o eterno-perecível. Eu estive vítima de um desgaste que não me tomou, apenas me empurrou para onde eu pensei que não mais voltaria. Trágica ilusão dos apaixonados: volto a cada dia.
O meu amigo, o barbeiro, reabriu a barbearia e voltou a trabalhar como há muito não fazia. Fui vê-lo, levei alguns cigarros para que ele me recebesse com sorrisos largos. Não que ele não o faça, mas o barbeiro também ensaiou a morte. E para falar da morte nós brindamos com fumaça.
Mas o Amor não é esse rio de coisas boas não, ele é traiçoeiro sim e espaçoso como ninguém. Deixaste-o entrar? Ha, podes esperar: ele vai tomar a tua cerveja, fumar o teu cigarro, ler as tuas poesias em voz alta, deitar na tua cama e, enfim, assim que ele cansar, carregará com ele tudo que ele pode levar.
E tu? Ficarás triste com os pedaços que ele deixará em cada canto: um cabelo no travesseiro, um cheiro na toalha de banho, um caderno teu que ele resolveu tirar do baú pra riscar, um prato sujo que tu terás que lavar e boas e lindas saudades pra que tu chores lembrando cada peripécia que ele causou enquanto te ocupava o coração.
Certo dia, cheguei a minha casa - tinha saído para comprar mantimentos (cadernos, vinhos e cigarro) - e, assim que entrei, senti um cheiro que já não me vinha há algum tempo. Como tu sabes, perfumes são belas armas. Sábias as mulheres que escolhem bem seus perfumes. Elas podem ser esquecidas, eles não. Eu te digo: sabes como tu podes conhecer uma mulher? Pergunta o nome do perfume dela, se ela não disser, descobre.
Seguindo: sentei na poltrona para tentar arrancar do vento o máximo que eu poderia daquele cheiro. Quando olhei para trás, o BAÚ estava aberto. O cheiro, as coisas, as roupas, as lembranças daquela mulher: tudo estava espalhado por cada canto daquela casa. E ela... Ah! Ela lá, deitada, nua, na minha cama. A mala em um canto e dentro dela nada além de saudade. Isso deixou a mala pesada. Assim ela tinha voltado ao nosso mundo. E eu, sentado diante do baú, só conseguia ver cada curva que a vida tratara de lhe esculpir. E quanto sentimento ainda havia! É assim que eu volto e começo a escrever a terceira estrofe!
Abraços, Desconexo.
Espero notícias suas.
Do teu amigo apaixonado, meio pilantra, meio Poeta.